Wednesday, November 30, 2005

E os setenta anos da morte de Fernando Pessoa

A morte acompanha-nos sempre, a morte é o que a vida recusa.
A vida é muito. Cresce na morte.
A morte é a vida a transformar-se.
Assim a vejo eu.

O Fernando Pessoa, daquilo que o conheço escrito, parece ter visto exactamente o oposto - a vida é a morte a transformar-se.
"(...) Pela morte vivemos, porque só somos hoje porque morremos ontem. Pela morte esperamos, porque só podemos crer em amanhã pela confiança na morte de hoje. Pela Morte vivemos quando sonhamos, porque sonhar é negar a vida. Pela morte morremos quando vivemos, porque viver é negar a eternidade! (...)"

É tido como sabido que Pessoa escreveu com o fingimento da sinceridade.
Como viveu e morreu não vi.

Monday, November 28, 2005

Mareorama


O Mar aqui, em Novembro, de manhã tem muitas cores. Não sei porquê.
Ao fim da manhã, gradualmente, as matizes intrometem-se, e vistas daqui, aproximam-se de um tom monocromático.
Hoje, como em muitos fins de semana, veêm-se velas brancas. Perfilam-se numa simetria sossegada.
Ao fim da tarde as nuvens descem ao mar e recebem o Sol.

Friday, November 25, 2005

O neutrino é uma partícula neutra, e parece que atravessa a matéria sem chocar com nada. São uma imensidão deles; em cada cm quadrado passam 60 mil milhões por cada segundo. Viajam a uma velocidade um pouco menor que a da luz. A sua massa é ainda desconhecida (julgo eu), mas é com certeza um "peso pluma".
Foi "inventado" em 1930 por Wolfgang Pauli. Criou-se para fundamentar a lei da conservação de energia.
É prodigioso pensar que são emitidos em quantidades "astronómicas" pelo Sol e pelas estrelas, e que percorrem o Universo em todos os sentidos. Atravessam de lado a lado um planeta ou um de nós sem chocar com nenhum átomo.
Ontem pensei neles como partículas livres, mas, sem chocar com nada, não deve ser liberdade.O mais provável é ser uma partícula solitária.

Só agora fui buscar o resultado das análises. Há uns meses caiu-me muito cabelo, mais de metade. Agora cresceu tanto que não se vê a risca, estão a ver? Aquele risco no cabelo, quando nos penteamos. Nas análises está tudo nos parâmetros normais, a causa é desconhecida. Por outro lado emagreci cinco quilos, mas a causa é reconhecida. É o Outono, fico sem fome.
Um bom dia!

Thursday, November 24, 2005

E hoje queria ser um neutrino, a partícula que se introduz no vazio intersticial da matéria tão fácilmente e livremente como um cometa atravessa o espaço intercósmico.

Sunday, November 20, 2005

Aqui descobri palavras. Penso por isso mais, nestes “sons” articulados. Expressões de pensamento, dialectos de significação.

Tenho andado a ler aos meus filhos a “Alice” de Lewis Carroll.

“- Quando uso uma palavra ela significa aquilo que eu quero que signifique...nem mais nem menos.- A questão é saber se o senhor pode fazer as palavras dizerem coisas diferentes, ponderou Alice. A questão – replicou Humpty Dumpty – é saber quem é que manda. É só isso.”

A legislação, a lei, é feita de palavras. Apesar de toda a jurisprudência e doutrina, muitas vezes, quem mais manda decide o significado das palavras.

Friday, November 18, 2005

Ontem fui ao teatro. Um dos meus irmãos é actor. Lá em casa, algumas vezes fiquei de castigo por ele ter nascido encantactor. Todos sabiam lá na casa , mas ele é que não sabia, por isso ultrapassava-se. Chorava de mansinho, num crescendo que caía no chão. Até eu acreditava que pudessem ter sido duendes a comer os bombons que tinham desaparecido da caixa debaixo da cama dos pais. O embrulho todo rasgado; alguém tinha que ficar de castigo. E os bombons eram para a dona Aida, a condessa. Não sei se era condessa, baronesa, ou marquesa, mas vivia num palacete que tinha uma sala, que tinha um piano, que tinha uma cauda. Quando a visitávamos, encontravámo-la sempre no jardim a podar as rosas. Lanchávamos no jardim e cantávamos “ainsi font, font, font...”. Comíamos scones com doce de morango, bebíamos chá, e como numa história da Condessa de Ségur, éramos uns amores de crianças durante duas horas.
O teatro, ontem.
A peça não me disse nada, por isso não tenho nada a dizer.
O meu irmão ultrapassa-se agora em palco. Já sabe que é actor, e continua encantador.

Thursday, November 17, 2005

Aqui, e talvez ali e acolá, parece ser importante saber se aquilo que se faz profissionalmente é reconhecidamente e publicamente mensurável, qualificável, "valorável", "catalogável", "quantificável", ..ável..vel..el
Eu não faço nada que possa ser reconhecidamente ou publicamente mensurável, qualificável, "valorável", "catalogável", "quantificável",...ável...vel...el
Parece-me que aqui , como acolá ou ali, esclarecer isto, possa ser "importantável"

Tuesday, November 15, 2005

Uma ciência que gosto muito é a química. De alguma maneira sempre a associei a poções mágicas , a alquimia, à transformação.

Não deixa de ser curioso que os alquimistas possam ter estado tão perto da realidade ao acreditarem que podiam transformar uma substância numa outra. Desconhecendo o que são os elementos, misturavam e aqueciam substâncias. Faziam química ao sintetizar e decompor, mas não podiam modificar a estrutura que define um elemento - a composição do seu núcleo. A sua concepção da matéria era falsa. Há no entanto uma presciência na alquimia.

Monday, November 14, 2005

Neste dia nasceu a minha pequenina, a última a morar em mim.
Eu amo os meus filhos, sei que já saíram, mas ainda os sinto crescer cá dentro.

Sunday, November 13, 2005

Porque é que as crianças nos seus traços informes procuram o que é redondo?
E porque é que os braços nascem sempre antes do corpo? E o corpo quando é desenhado precisa de pernas?
E porque são todas assim?
Eu não sei, mas já soube.

Friday, November 11, 2005


Hoje ao fazer mais uma lista de compras imaginei

- madeira de carvalho
- pano latino
- dois ou três mastros
- quilha
- um convés
- um castelo de proa
- uma coberta
- uma balestilha
- a estrela polar

Pensei de ouvido

O ranger do cordame, o bater das pontas dos rizes no estai, o impulso do vento a rondar a popa, o matraquear das adriças, o sussurrar da água contra o costado.
Largar as velas, navegar à bolina.

Wednesday, November 09, 2005

Enquanto deitava os meus filhos, lembrei-me que eu na idade deles tinha mil colchões em casa. Sei que parece mentira, mas é verdade. Durante grande parte do tempo não eram utilizados e antes de serem arrumados, atiravam-nos cá de cima do hall da rampa lá para baixo para um outro hall, o da televisão. Ficavam lá uns dias e eram depois levados progressivamente para o pátio para serem batidos antes de hibernarem. Durante esses dias eu e os meus irmãos tínhamos o nosso desporto radical . Mergulhávamos de uma altura que não sei precisar. Sei que quando aterrávamos ficavamos submersos nos colchões. O truque era saltar de braços abertos. Para que os braços nos impedissem de descer muito fundo.
Acho o erro essencial e indispensável. É característico da vida. Impele-nos a mudar.
O erro parece ser variabilidade, diversidade e evolução.
Cometo muitos erros, uns propositados (como o título deste blog, por exemplo), outros completamente despropositados . Um dos disparatados foi ter apagado tudo que estava ali para baixo.

Gosto do erro porque se revela.


Segundo neurologistas, o nosso cérebro dá-nos percepções erradas da realidade.
O curioso é que são esses erros que permitem um comportamento inteligente numa realidade tão complexa. Uma máquina que aborde o mundo numa perspectiva pura da lógica, é incapaz de se comportar inteligentemente na nossa realidade. Percebe-se que as falhas no tratamento de informação feito pelo nosso cérebro, são capacidades inigualáveis, que nenhuma máquina pode ainda reproduzir.
Há no entanto erros que tendo nós conhecimento deles, poderíamos tentar limitar.
Este poderá ser um exemplo:
- Ser coerente a qualquer preço.
Verifica-se que o nosso cérebro tem tendência a agir mais fácilmente no sentido de confirmar as nossas posições iniciais, do que pelo contrário, agir de maneira a contradizer a posição já tomada.
Uma experiência realizada não me lembro por quem, mas que imagino que possam ter sido psicólogos, verificou este facto:
-Apenas 30% dos transeuntes que viam caír uma nota da bolsa de uma outra pessoa (alguém contratado para o efeito) , a devolviam espontâneamente ao seu proprietário.
Por outro lado, a taxa subiu para 70% quando alguém dez minutos antes (também um "actor"), pediu que lhe indicassem o caminho, agradecendo calorosamente a sua civilidade.
Concluiu-se que transmitir a alguém a ideia de que é civilizado, semeia nele a ideia de confirmar essa imagem. (Neste caso uma indução pela positiva)

Tenta-se evidenciar que o facto de um indivíduo adoptar uma escolha, o faz sentir aprisionado. A tendência é conformar-se e adoptar comportamentos no mesmo sentido.
Eu decidi parar de escrever, mas não me sinto de maneira nenhuma aprisionada a essa escolha. Conhecendo este "erro " do cérebro de se enformar num comportamento anterior, não deixo de fazer aquilo que agora tenho vontade - escrever aqui.

Saturday, November 05, 2005

De um episódio de fuga - a apoptose ou o silêncio da anulação da linguagem.


Uma vez escrevi (estava ali em baixo, agora não sei onde está) que só dividimos o que diminui. No entanto acrescentei no fim, que dividíamos a vida (e que nos ofereciam a morte).

É evidente que falava de nós, de complexos de sistemas vivos.
As células dividem-se e aumentam, criando tecidos e formando orgãos. Existem no entanto no ciclo celular dois processos opostos. A divisão celular, e a morte celular. A esta morte celular chama-se apoptose.
A apoptose remove determinadas células durante o crescimento e desenvolvimento, permitindo, em equilíbrio com a mitose (divisão celular), manter a forma dos orgãos, do corpo.
Os mecanismos que controlam o ciclo celular ainda não são totalmente conhecidos. Sabe-se no entanto que há sinais químicos que controlam o ciclo celular; sinais que provêm de fora e de dentro da célula. Os sinais exteriores são os hormônios, que agem à distância. Os sinais internos são duas proteínas, uma delas a ciclina, a outra - a quinase. A quinase poderia chamar-se quinau ( acto ou efeito de corrigir um erro ), vinha mais a propósito.

A mudança do estado de quiescência é essencial para um estado de crescimento activo.