Friday, December 30, 2005

E a propósito da quadra

Ter sabido que Jesus não deixava prendas no sapatinho ensinou-me a invenção da mentira.
Saber agora que afinal o Natal existe ensina-me que a mentira tem movimento contrário. Ensina-me também que se existe, deixa sentir falta.

Thursday, December 22, 2005

E no princípio era o verbo ...

"Enquanto os livros estão escritos em palavras de comprimento variável, utilizando vinte e seis letras, os genomas estão inteiramente escritos com palavras de três letras, utilizando apenas quatro letras: A, C, G e T ( que significam adenina, citosina, guanina e timina). E em vez de estarem escritos em páginas planas, estão escritos em longas cadeias de açucar e fosfato, chamadas moléculas de ADN, às quais as bases estão ligadas como escadas de mão laterais. Cada cromossoma é um par de moléculas ( muito) longas . Colocados de extremidade a extremidade e estendidos a direito, todos os cromossomas de uma única célula teriam um comprimento de cerca de 183 cm. Todos os cromossomas de todas as células de um corpo cobririam 160 mil milhões de quilómetros (...) A ideia do genoma como um livro não é, estritamente falando, sequer uma metáfora. É literalmente verdade. Um livro é um pedaço de informação digital, escrito de uma forma linear, unidimensional e unidireccional e definido por um código que transcreve um pequeno alfabeto de símbolos num grande léxico de significados através da ordem dos seus agrupamentos. Assim é o genoma."

Genoma. Matt Ridley, Gradiva


Tuesday, December 20, 2005

Já estamos tão perto do Natal. Há tanto a fazer, a preparar. E eu gosto de cozinhar, de sentir o cheiro mais cheio. Cozinhar o Natal materializa memórias de paz.
Os meus filhos também preparam o Natal. Ensaiam canções, pintam Jesus bebé, recortam estrelas, e as duas meninas, com as primas, experimentam dançar como os anjos.
Faltam as prendas, ainda não comprei nenhuma. Vou passar estes dias nos centros comerciais à procura do que não está lá.

Friday, December 16, 2005

A ciência do século XVII, até ao primeiro quarto do século XX , chegou a uma visão do mundo em que os acontecimentos seriam perfeitamente determinísticos, ou seja – o que acontece tem uma causa. (A física quântica com a interpretação mais correcta dos quanta, verificou que o determinismo não pode ser completo) .
Julgo que a ciência não tem a verdade, observa efeitos e procura as causas por exclusão. Mas cabe numa parte. É um retalho verosímel.
A justiça nunca é um retalho verosímel, precisa do todo.
O todo é ordenado? As injustiças serão partes desordenadas? As leis são ordens? As agraphoi nomoi – leis naturais, não escritas -, impulso de filantropia e solidariedade estarão presentes nos Homens? Sempre?
E a liberdade parece-me ainda mais complicada, com a sua dicotomia – autonomia/responsabilidade.
A autonomia, decidir e agir. A responsabilidade, os efeitos nos outros envolvidos que muitas vezes não têm responsabilidade na causa da decisão.
Compatibilizar liberdades , não será esse um dos maiores mistérios guardados no Universo?

Wednesday, December 14, 2005

Tenho andado doente, não gosto de estar doente. A boca sabe mal, o corpo assusta-se e treme.
Quando me doi a cabeça gosto de ler.
Então li.

Do Edgar Poe: O corvo e outros poemas, tradução de Fernando Pessoa.
Nas últimas páginas trazia uma análise à génese de um poema, feita e feito (a análise e o poema) pelo próprio Poe, à qual chamou - A filosofia da composição.
" (...) e visto que o interesse de uma tal análise ou construção, que considerei como um desideratum em literatura, é completamente independente de qualquer interesse real suposto na coisa analisada, não me acusarão de faltar às conveniências, se desvendar o modus operandi graças ao qual pude construir uma das minhas próprias obras (...) a minha intenção é demonstrar que nenhum ponto da composição pode ser atribuído ao acaso ou à intuição, e que a obra avançou, passo a passo, para a solução, com a precisão e a lógica rigorosa de um problema matemático (...)"


Já não me doi a cabeça.
Então escrevi.

Prova o mar. Que sabor doce e quente tem?
(são rabanadas? ou aletria?
sabe-te a prosa ou poesia?)
É sal atirado pela Terra mãe.

Sente. Estátua metrificada?
(mexes na tinta? pintas com preto?
nadas frases, flutuas sonetos?)
Mar é pai de toda a vida criada.

Wednesday, December 07, 2005

Fiz girar a roda do leme. Ofereci a proa ao vento. As velas por um momento tornaram-se bambas, depois, sob o impulso do stretto, vibraram num movimento inconcebível.
As vagas inundaram o castelo de proa. A meia-nau, sinto violentos esticões provocados pelas correntes das âncoras.
O vento fala-me das sonoridades impressas no ar.

Em termos náuticos, o caminho seguido numa viagem por mar é chamado de derrota.
Este, ali em cima, ancorado, é a minha derrota.

Monday, December 05, 2005

Ontem um familiar meu foi preso. Estranho, o que me contaram foi que não esteve presente em julgamento; faltou como testemunha. Apesar de ter justificado a falta, esta não chegou ao juiz.
Hoje, agora, já está em tribunal. Ainda não sei nada. Imagino que tenha tido uma noite que nunca mais vai passar.



Já está em casa, foi um engano do tribunal, a juíza aconselhou-o a processar o tribunal.
( agora sei modificar isto, posso actualizar a notícia)

Sunday, December 04, 2005

respiração

Inspiro e recebo. Expiro, dou e preciso. Inspiro e reencontro. Reconcilio-me.

O aparelho respiratório é um tubo que começa no nariz, continua pela faringe, a laringe, a traqueia e os brônquios. Alarga-se numa maior superfície ao nível dos alvéolos pulmonares, e aí permite o intercâmbio de gases com o sangue. Esse intercâmbio de oxigénio e dióxido de carbono recebe o nome de respiração. É claro que nada disto é novidade. É também senso comum constatar que o sistema respiratório e o sistema circulatório trabalham em estreita colaboração. Todos sabemos que um choque emotivo estrangula a respiração ainda antes de se sentir o aceleramento do coração. Pelo contrário, quando estamos tranquilos a respiração é naturalmente lenta.
Nas nossas heranças ancestrais, o ritmo respiratório controlado e constante (muitas vezes acompanhado de movimento balanceado), faz parte de rituais de oração, de procura de essência espiritual, energia única.
Mais curioso é saber que há quem associe o ritmo respiratório ao comportamento. Há quem afirme que o ritmo respiratório condiciona e orienta o comportamento de massas. Que os hinos, marchas ou slogans impõem ritmos colectivos que transpõem o individual.